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Feitiço do Villa-Lobos segue forte com acervo on-line e biografia

RIO – O aniversário é de morte — 60 anos neste domingo —, mas a sua marca é um legado bem vivo. Em tempos de cultura brasileira na montanha-russa, duas boas notícias sobre Heitor Villa-Lobos ajudam a celebrar a efeméride e devem reverberar com força em 2020. A primeira: o museu que leva o nome e se dedica à memória do compositor não só está na reta final da digitalização de seu acervo, como acaba de colocar parte dele para consulta on-line. A segunda: vem aí uma nova biografia do autor das “Bachianas brasileiras”.

Comecemos pela segunda. Villa-Lobos (1887-1959) está longe de ser um personagem pouco explorado em biografias e teses — além de filmes, como a ficção “Villa-Lobos: uma vida de paixão” (2000), de Zelito Viana, e o documentário “Villa-Lobos: de Bach ao Brasil”, de Carlos Andrade, que passa neste domingo às 22h no Film & Arts. São mais de 30 livros sobre ele e centenas de trabalhos acadêmicos. Ainda assim, há lacunas sobre sua trajetória. O novo livro, escrito por Rodrigo Alzuguir, promete mergulhar na figura humana por trás de obras seminais da música brasileira.

Alzuguir assina “Wilson Baptista — o samba foi sua glória” (Casa da Palavra), biografia definitiva do compositor, que levou o Prêmio Jabuti da categoria em 2014. Pesquisador daqueles aficionados, foi convidado pela Companhia das Letras a se debruçar logo em seguida, e com igual profundidade, na vida de Villa-Lobos.

— Algumas das biografias existentes, como a primeira, de Vasco Mariz ( de 1949 ), tiveram o próprio Villa como fonte direta. O que é maravilhoso, mas também limita, porque há fases da vida que ele parecia não querer comentar — diz o escritor, lembrando que há pelo menos três anos entre a adolescência e a juventude em relação aos quais quase não há histórias conhecidas sobre o músico.

Villa-Lobos e Arminda tocam percussão (foto sem ano identificado) Foto: Divulgação / Acervo Museu Villa-Lobos
Villa-Lobos e Arminda tocam percussão (foto sem ano identificado) Foto: Divulgação / Acervo Museu Villa-Lobos

A pesquisa começou em 2014 e, graças a ferramentas atuais, como a hemeroteca da Biblioteca Nacional, já encontrou peças que faltavam no quebra-cabeças. Ao achar documentos dos irmãos do músico, por exemplo, Alzuguir chegou à casa onde a família morou nos primeiros anos do pequeno Heitor.

Quando bateu na porta do sobrado na rua Santa Cristina, na subida para Santa Teresa, e deu de cara com uma escada de madeira, não teve dúvida de que se tratava do lugar certo. Lembrou da referência citada em um livro infanto-juvenil sobre o compositor — “Villa-Lobos, alma sonora do Brasil” (1959), de Arnaldo Magalhães de Giacomo — que descrevia como o menino se sentava no topo da escada para ver os saraus promovidos pelo pai. Com o apoio do proprietário atual, a ideia é colocar uma placa na porta, registrando que ali morou o maestro.

Da juventude, Alzuguir conclui que Villa-Lobos soube explorar a necessidade de viajar a trabalho — foi caixeiro-viajante vendendo de bananada a fósforo de duas cabeças — para conhecer de perto a variedade da música brasileira.

Villa-Lobos regendo concentração orfeônica de 35.000 escolares, no Estádio do Vasco da Gama. Rio de Janeiro, 1942 Foto: Divulgação / Acervo Museu Villa-Lobos
Villa-Lobos regendo concentração orfeônica de 35.000 escolares, no Estádio do Vasco da Gama. Rio de Janeiro, 1942 Foto: Divulgação / Acervo Museu Villa-Lobos

— Mais velho e já reconhecido, ele narra essa experiência como se tivesse viajado para fazer essas pesquisas, como Mário de Andrade. Mas, de certa forma, o que ele fez foi juntar o útil ao agradável — observa o pesquisador.

Na experiência de Villa como educador musical — seu projeto de canto orfeônico teve impacto na vida de muita gente, como Elton Medeiros e Hermínio Bello de Carvalho —, há também certas interpretações que Alzuguir contesta. Como a de sua ligação com o Estado Novo.

— Quando, em 1931, Villa aceita o convite para dirigir a Superintendência de Educação Musical e Artística, temos Getúlio Vargas num governo provisório e eleições no horizonte. Em 1937, o programa de canto nas escolas já estava consolidado. Nesse sentido, a propaganda autoritária é que se apropriou do projeto musical de Villa-Lobos.

Rodrigo Alzuguir escreve a nova biografia do autor de 'Bachianas brasileiras' Foto: Marcelo Rodolfo / Divulgação
Rodrigo Alzuguir escreve a nova biografia do autor de ‘Bachianas brasileiras’ Foto: Marcelo Rodolfo / Divulgação

Imagens a um clique

Fundamental para a pesquisa de Alzuguir, o acervo do Museu Villa-Lobos teve sua coleção de fotografias, com cerca de 1.800 imagens (como as que ilustram esta página), disponibilizadas há poucas semanas no site museuvillalobos.acervos.museus.gov.br/acervo/ . Passo importante num projeto de digitalização que começou nos anos 1990, e já fez cópias digitais de cerca de 70% das partituras, fotos e correspondências guardadas no casarão de Botafogo. Com verba do edital do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, agora a instituição corre para concluir os 30% restantes, que correspondem a 25 mil documentos, como programas de concertos e diplomas. Para colocar a coleção on-line, a instituição contou com uma parceria do Instituto Brasileiro de Museus com a Universidade Federal de Goiás, que permitiu o acesso a uma ferramenta para facilitar o carregamento de dados e as buscas.

— É gratificante ter tanta coisa digitalizada, mas até então o acesso a esse material continuava sendo coisa do século XX: a pessoa tinha que entrar em contato com a gente por e-mail para pedir a foto. Não mais. O próximo passo é colocar as cerca de 4 mil correspondências e, em seguida, as partituras— conta o historiador Pedro Belchior, da equipe do museu, que espera ver todo o acervo on-line ainda no primeiro semestre de 2020.

Motivação para concertos do Festival Villa-Lobos, que acaba hoje, lançamento de discos (como “Cores de Villa-Lobos”, de Marina Cyrino), relançamento de livro (“Villa-Lobos e a Música Popular Brasileira, uma Visão sem Preconceitos”, de Ermilinda Paz) e palestras na Universidade de San Diego, nos EUA, a efeméride também representa um marco para o museu.

— É uma data especial porque o museu foi criado sete meses depois da morte do Villa. Dona Arminda (segunda mulher do músico ) foi a diretora pelos primeiros 25 anos. Por isso, ano que vem vamos comemorar o aniversário com uma homenagem a ela — explica Claudia Nunes de Castro, atual diretora do museu. — Muito dessa memória que hoje preservamos, inclusive recortes de jornais do mundo inteiro, existe graças ao seu esforço.

Fonte: O Globo

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