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Quais as diferenças entre vinhos de climas quente e frio?

Quando você se depara com um vinho opulento, muito frutado, alcoólico, logo o associa a alguma região vitivinícola tropical? Quando encontra aromas sutis, tons mais herbáceos, sutilezas em boca, possivelmente vincula a produtores de locais mais frios?

Essas associações “óbvias” quase sempre são feitas em nossas mentes para facilitar a identificação de rótulos provenientes de denominações quentes ou frias.

Que outras características denotariam um vinho que veio de uma região mais cálida ou mais fresca? E será que alguns atributos específicos preconcebidos seriam hoje suficientes para apontar de onde veio um vinho?

Acredita-se que as regiões mais adequadas para a produção de vinho no mundo estejam entre os paralelos 30º e 50º de latitude, que costumeiramente convencionamos chamar de clima temperado.

Nessa faixa, os pontos mais próximos do Equador, com ambientes quase tropicais, são considerados regiões de “clima quente”. Já as mais afastadas, mais austrais ou setentrionais, de “clima frio”. Assim, por exemplo, uma região como o estado de Washington é tida como sendo de clima frio e a Califórnia, por sua vez, de clima quente.

Mas vale lembrar que o clima pode variar também em função da altitude. Locais mais altos costumam ter temperaturas mais baixas que vales de rios, por exemplo. E outras circunstâncias também influenciam, como regime de chuvas, insolação, ventos etc. Isso pode criar situações pontuais em regiões, tornando-as mais “quentes” ou mais “frias” do que outras em latitudes similares.

As principais diferenças

Então, como as diferenças climáticas afetam o vinho? As regiões de clima quente tendem a ter temperaturas mais consistentes ao longo do ciclo da videira. Essa menor diferença dá às uvas a chance de amadurecer por completo, mas, por outro lado, a acidez natural nas uvas tende a ser diminuída. Assim, generalizando, climas quentes produzem uvas com sabores de frutas mais maduras e menos acidez.

Já o que se observa nas regiões de clima frio não é apenas uma tendência a ter médias de temperatura mais baixas, mas, principalmente, uma diferença entre máximas e mínimas durante dias e noites. Vale lembrar que temperaturas mais baixas preservam a acidez, mas também tornam mais lento o amadurecimento. De modo geral, regiões vinícolas de clima frio tendem a produzir frutas mais ácidas.

Resumindo, uvas de regiões mais frias normalmente amadurecem mais lentamente, o que resulta em açúcares naturais mais baixos e maior acidez, possivelmente menos álcool. Em climas quentes, a velocidade de maturação tende a ser maior e, com isso, a concentração de açúcar aumenta, os níveis de acidez diminuem e costuma-se ter mais volume alcoólico. Essas talvez sejam as diferenças mais fundamentais entre climas quentes e frios, mas há outros detalhes a se levar em consideração.

Desafios do clima

Algumas das “convenções” para se considerar uma região como clima frio é que as temperaturas durante a estação de crescimento sejam inferiores a 16,5°C. Para o clima quente, considera-se entre 18,5 e 21,5°C. E cada clima oferece desafios diferentes para seus produtores.

Em regiões frias, as vinhas podem ter menor rendimento, invernos rigorosos podem ser bastante prejudiciais, assim como geadas tendem a ser mais comuns e destrutivas. Basta ver as notícias de safras recentes na Borgonha e Bordeaux, em que geadas severas comprometeram o volume da safra, para compreender isso.

plantação de uvas no frio
Regiões de clima frio tendem a ter uma grande diferença entre temperaturas máximas e mínimas durante os dias e as noites, e estações marcadas. Se a temporada de crescimento no verão for curta ou fria, as uvas podem não amadurecer totalmente


Além disso, se a estação de crescimento no verão for muito curta ou fria, as uvas podem não amadurecer completamente. Por esse motivo, em muitas regiões a chaptalização (a adição de açúcar ao mosto para que os níveis de álcool aumentem durante a fermentação) é uma prática permitida. Devido a esses fatores, a variação entre as safras de regiões frias tende a ser muito maior.

Em locais mais quentes, com mais sol, clima mais consistente, o período de maturação costuma ser mais longo. Mas a viticultura aqui também tem seus problemas. Os produtores geralmente lutam para manter a acidez nas uvas – que diminui à medida que o açúcar se acumula – e o frescor dos vinhos. Na vinícola, medidas podem ser empregadas para ajudar, como a adição de ácido e até a redução dos níveis de álcool (uma prática controversa), mas, cada vez mais, os produtores têm tentado gerenciar essas questões através de manejos no vinhedo.

Aromas e sabores

Falando de forma genérica, os vinhos em climas quentes geralmente são mais encorpados do que os vinhos em climas frios. Seus níveis de açúcar se traduzem em um maior teor alcoólico. Os tintos são profundos e cheios, com especiarias e notas de frutas negras, como cereja e ameixa. A maturidade também se manifesta com uma nota de frutas secas e alguns podem até exibir notas de chocolate. Cascas grossas de algumas variedades tintas ajudam a proteger do sol e assim proporcionam um vinho com taninos estruturados, corpos poderosos, voluptuosos.

Por outro lado, vinhos de clima frio costumam ser mais ácidos e frescos. As frutas apresentam sabores mais azedos, como amora, framboesa, maçã verde, assim como notas herbáceas, de pimenta, terrosas etc. São vinhos que tendem a ter a ser menos encorpados com teores alcoólicos mais baixos. Muitas vezes, esses vinhos estão associados a aromas e sabores delicados, menos pungentes do que seus pares de climas quentes.

Em geral, frutas maduras no nariz e palato sugerem mais luz do sol e climas mais quentes; por outro lado, pense em lugares mais frios se você provar frutas verdes, azedas e com maior acidez.

Comportamento

Cada variedade de uva tende a se comportar de uma forma dependendo do clima da região. Estamos acostumados a ver castas como Chardonnay, Cabernet Sauvignon, Merlot, Syrah etc., cultivadas nos mais diversos recantos do planeta e, os vinhos produzidos em cada ponto, feitos com as mesmas cepas, mostram características diferentes. Como diriam os franceses, essa é a magia do terroir – o termo que eles criaram para englobar solo, clima e também aspectos culturais que formam a personalidade de um vinho.

Um Cabernet Sauvignon bordalês, por exemplo, costuma ser mais herbáceo e fresco do que um do Napa Valley. Além disso, em áreas quentes, o teor de álcool é maior e a fruta é muito mais madura (pode-se pensar em frutas quase cozidas), os taninos são mais macios e a acidez menos pungente. Um Pinot Noir da Borgonha, por exemplo, tende a ter frutas vermelhas vibrantes, acidez refrescante e talvez mais mineralidade ou notas terrosas em comparação com as notas mais maduras, suculentas e escuras de um Pinot do Novo Mundo.

Pode-se dizer ainda que algumas variedades tendem a se dar melhor em zonas mais frias, enquanto outras preferem calor e sol, dependendo do ciclo vegetativo, entre outras coisas. O clima afeta diretamente o crescimento das plantas. Historicamente, Riesling, Sauvignon Blanc, Pinot Gris e Gewürtztraminer, Pinot Noir etc., são variedades que se mostraram melhor adaptadas a climas mais frios. Malbec, Grenache, Syrah, Zinfandel, Moscato etc., por sua vez, estiveram mais ligadas a regiões quentes.

Mas, podemos dizer que, a adequação de uma uva ao clima pode ser manipulada através do manejo do vinhedo e também pelo vigor dos solos e porta-enxertos usados.

Onde é quente e onde é frio?

Regiões popularmente conhecidas como sendo de clima frio compreendem Champagne, na França, Trentino-Alto Ádige, na Itália, Mosel, na Alemanha, Central Otago, na Nova Zelândia, Washington e Oregon, nos Estados Unidos, Niágara, no Canadá etc. Já as de clima quente compreendem o Napa Valley, nos Estados Unidos, a Sicília, na Itália, a Catalunha, na Espanha, o Alentejo, em Portugal, Mendoza, na Argentina etc.

mapa mundiComo se vê, em alguns países, há regiões que podem ser consideradas de clima frio e outras de clima quente. No Chile, por exemplo, a região do vale do Maipo está ligada ao calor, mas zonas como o vale de Casablanca já se vinculam ao que se pode considerar clima frio. Na Itália, as regiões do sul e centrais tendem a ser consideradas de clima quente, já o norte, frio. Mas deve-se ponderar que o clima quente de Mendoza, por exemplo, talvez possa ser bem mais intenso do que se considera clima quente na Itália.

Além disso, devemos lembrar que é possível ter diferentes “microclimas” dentro de uma região. Por exemplo, falamos da Califórnia como uma grande área, mas, dentro dela, Sonoma é um vale mais frio do que o Napa. Dentro de Sonoma, o Russian River Valley, por exemplo, é uma das áreas mais frias se comparado com Alexander Valley. E por aí vai.

Mudanças climáticas e colheitas antecipadas

Diante do aquecimento global e de mudanças climáticas, ultimamente tem sido cada vez mais difícil diferenciar vinhos de regiões tradicionalmente de clima frio das de clima quente. Em Bordeaux, por exemplo, não tem sido incomum encontrar vinhos com 15% de álcool, tal qual no Novo Mundo. Ou seja, em alguns casos, pode-se encontrar rótulos tão opulentos quanto em terras teoricamente mais quentes.

balão voando sobre lago
Tem sido cada vez mais difícil diferenciar vinhos de regiões tradicionalmente de clima frio daquelas de clima quente, devido ao aquecimento global e o aumento da temperatura no planeta, algo que atinge diretamente a viticultura


Diante do aquecimento, vê-se cada vez mais produtores colhendo mais cedo, para que as uvas não fiquem sobremaduras e percam a acidez. Esse tipo de prática tem sido muito comum também no Novo Mundo, onde outro método comum tem sido colher durante a noite para evitar o excesso de calor do dia. A principal razão para uma colheita antecipada é tentar equilibrar a obtenção da uva mais madura possível em termos de açúcar e fenóis, sem perder toda a acidez.

Cada vez mais, as condições da safra, além das escolhas tanto no campo quanto na vinícola, nublam as “linhas demarcatórias” entre regiões frias e quentes. E, à medida que as mudanças climáticas continuarem, é provável que vejamos safras mais inconsistentes de ano para ano, o que dificulta cada vez mais a generalização de estilos. Não à toa, produtores estão buscando novas fronteiras vinícolas em regiões cada vez mais austrais ou setentrionais. Talvez no futuro, o que convencionamos apontar como vinhos de clima quente ou frio tenha novas definições.

Escala de Winkler

ESCALA DE WINKLER

A escala de Winkler é uma técnica para classificar o clima das regiões produtoras de vinho com base na soma de calor ou crescente de graus-dia (uma medida de acumulo de calor utilizado por agricultores para prever as taxas de desenvolvimento de plantas).

Por ela, as áreas geográficas são divididas em cinco regiões climáticas com base na temperatura convertida em crescente de graus-dia e são comumente conhecidas como regiões de I a V. Esse sistema foi desenvolvido na Universidade da Califórnia, Davis, por Albert Winkler e Maynard Amerine.

Segundo ele, as regiões de número mais baixo são adequadas para variedades de amadurecimento precoce e as de números mais alto, para variedades de uva de consumo in natura e vinho de mesa. Locais como Inglaterra e Canadá, Champagne e Central Otago, estão classificados como IA (existe o nível IB também, onde está Borgonha, por exemplo). Já Piemonte e Douro, por sua vez, pulam para região II. Rioja e Sonoma passam para o nível III. Toscana e Languedoc-Roussillon são escala IV. Ilha da Madeira e Hunter Valley, na Austrália, estão entre as regiões V.

AS PRINCIPAIS DIFERENÇAS NO ESTILO DOS VINHOS DE CLIMA QUENTE

videiras
  • Frutas maduras – Maior teor alcoólico
  • Opulência – Encorpados – Taninos suaves
  • Aromas potentes – Menor acidez – Safras constantes

VARIEDADES MAIS ADAPTADAS

  • Cabernet Sauvignon – Malbec
  • Grenache Zinfandel
  • Moscato Syrah

EXEMPLOS DE REGIÕES

  • Mendoza, Argentina – Sicília, Itália
  • Rioja, Espanha – Languedoc, França
  • Napa Valley, Estados Unidos – Barossa, Austrália

AS PRINCIPAIS DIFERENÇAS NO ESTILO DOS VINHOS DE CLIMA FRIO

videiras no clima frio
  • Frutas frescas – Menor teor alcoólico
  • Sutileza – Menor intensidade – Taninos ásperos
  • Aromas delicados – Maior acidez – Safras variáveis

VARIEDADES MAIS ADAPTADAS

  • Pinot Noir – Riesling
  • Sauvignon Blanc – Gamay
  • Merlot – Pinot Gris

EXEMPLOS DE REGIÕES

  • Oregon, Estados Unidos – Mosel, Alemanha
  • Leyda, Chile – Champagne, França
  • Central Otago, Nova Zelândia – Alto-Ádige, Itália

Por Revista Adega

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