SIGA O JUSCELINO NAS REDES  
  
  
  
  
Home > Cultura > Anita Malfatti: a pintora brasileira está no ar

Anita Malfatti: a pintora brasileira está no ar

Anita Malfatti está no ar. O universo da artista paulistana está à disposição de todos. Com um clique, o internauta pode conhecer e refletir sobre a sua história e sua arte devidamente documentada no Arquivo e Coleção de Artes Visuais do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP.

A coordenação do projeto é da professora Mayra Laudanna, do IEB. “A fonte desta pesquisa sobre Anita Malfatti é, principalmente, a documentação primária da artista depositada no Arquivo e na Coleção de Artes Visuais do IEB”, explica. “Esse patrimônio é composto de cartas e bilhetes que ela recebeu, textos que escreveu, diversas fotos e recortes de revistas. Há ainda os cadernos de desenho, que reúnem desde exercícios de geometria, realizados no decênio de 1910, até anotações desenhadas de paisagem que ela fez nos anos de 1940 ou posteriormente, que lhe serviram para realizar pinturas.”

O site induz à reflexão. Ver Anita Malfatti exige um olhar atento, uma leitura mais pausada para perceber detalhes de sua história e conhecer uma face ainda silenciosa da artista. “São vários os exemplos contidos nos cadernos de desenho”, orienta Mayra. “Eles possibilitam observar as diferentes pesquisas artísticas de Anita Malfatti: inicialmente vê-se um traço incerto, irregular, como o da maior parte dos estudantes, e, após o decênio de 1920, em especial a partir da observação de modelo vivo, o domínio da linha, a ponto de uma figura ser resolvida basicamente por um traço. Mas não só. Logo após a chegada da artista a Paris, no início dos anos de 1920, veem-se, entre suas pesquisas, as realizadas com formas ovais, como as produzidas pelo escultor Victor Brecheret e, posteriormente, por Tarsila do Amaral.”

São vários os exemplos contidos nesses cadernos que possibilitam observar as diferentes pesquisas artísticas de Anita Malfatti: inicialmente vê-se um traço incerto, irregular, como o da maior parte dos estudantes e, após o decênio de 1920, em especial a partir da observação de modelo vivo, o domínio da linha, a ponto de uma figura ser resolvida basicamente por um traço. Mas não só: logo após a chegada da artista em Paris no início dos anos de 1920, veem-se, entre suas pesquisas, as realizadas com formas ovais, como as produzidas pelo escultor Victor Brecheret e, posteriormente, por Tarsila do Amaral.”

Ver é perceber, contemplar, divisar, fazer indagação e/ou investigação; ver é descobrir, examinar e chegar a conclusões após conhecer alguém e algum lugar.”

A imagem que abre o Ver Anita Malfatti é a obra O Estudo do Homem, de 1915/16, em carvão e pastel. O mesmo homem inserido na natureza introduz o vídeo de cinco minutos com uma sequência de desenhos e pinturas da artista em uma produção da Parábola Filmes.

O desafio de introduzir o espectador/leitor no arquivo do IEB, através da internet, é de Mayra Laudanna e Bianca Maria Abbade Dettino, supervisora técnica da Coleção de Artes Visuais. “O acervo oferece múltiplas possibilidades para conhecer o trabalho da artista”, esclarece a professora. “Após considerar o material existente no IEB, realizou-se outro levantamento, este em plataformas digitais, que facultam acesso a periódicos. Como não poderia deixar de ser, a pesquisa também considerou a bibliografia existente sobre a artista, outras informações e textos indispensáveis ao conhecimento do período em que ela viveu, das ideias artísticas defendidas por intelectuais, por grupos do tempo e pela própria artista, em diferentes momentos de sua trajetória.”

O projeto do site foi crescendo diante da extensão do material. “O site destaca vários aspectos desconhecidos sobre a artista, propondo uma visão diferenciada sobre ela. Eu e Bianca pensamos em um título que traduzisse esse olhar. Pensamos em Ver Anita Malfatti porque ver é perceber, contemplar, divisar, fazer indagação e/ou investigação. Ver é descobrir, examinar e chegar a conclusões após conhecer alguém ou algum lugar.”

O formato do site, aparentemente simples, é inusitado pela pesquisa. A biografia de Anita Malfatti vem desde a comunicação do casamento dos pais – o engenheiro italiano Samuel Malfatti e a norte-americana Eleonora Elisabeth –, em Campinas (SP), anunciado nos dias 5 e 6 de outubro de 1887 em dois jornais: Germania. Allgemeine deutsche Zeitung für Brasilien e Correio Paulistano. Com a devida cópia da publicação registrada no site.

Logo após a Proclamação da República, em 2 de dezembro nasce a futura pintora Annita Catarina Malfatti, na rua Florêncio de Abreu.”

A história da artista e de sua família é contada com o texto preciso de Mayra Laudanna, acompanhado de uma pesquisa de fotos. Exemplo: “Logo após a Proclamação da República, em 2 de dezembro nasce a futura pintora Annita Catarina Malfatti, na rua Florêncio de Abreu, nº 67. Segundo filho do casal Samuel e Eleonora Elizabeth, o irmão mais velho, Alexandre, estava com cerca de dois anos.” A informação é acompanhada de uma foto de 1887 da rua Florêncio de Abreu, tirada por Militão Augusto de Azevedo. O levantamento fotográfico no acervo foi feito por Rafaela Miyoko Asanome e Luisa Bartalini França, pesquisadores da equipe do IEB.

A história é marcada por fatos que registram o falecimento do pai, em 29 de dezembro de 1902, com notas nos jornais O Estado de S. Paulo e O Comércio de S. Paulo, a mudança para a casa de seus avós maternos, o ingresso no Mackensie College, em 1904, e as primeiras exposições da artista.

O internauta pesquisador pode acompanhar as lembranças e dúvidas da então Annita Catarina adolescente. Reminiscências que marcaram a sua vida:
“Eu tinha 13 anos. E sofria, porque não sabia que rumo tomar na vida. Nada ainda me revelara o fundo da minha sensibilidade, o pequeno gênio dos destinos terrestres não me segredara ao ouvido o caminho que deveria seguir. Resolvi, então, me submeter a uma estranha experiência: sofrer a sensação absorvente da morte. Achava que uma forte emoção, que me aproximasse violentamente do perigo, me daria a decifração definitiva da minha própria personalidade. E veja o que fiz: nossa casa ficava perto da estação da Barra Funda. Um dia saí de casa, amarrei fortemente as minhas tranças de menina, deitei-me debaixo dos dormentes e esperei o trem passar por cima de mim. Foi uma coisa horrível, indescritível! O barulho ensurdecedor, a deslocação de ar, a temperatura asfixiante deram-me uma impressão de delírio e de loucura. E eu via cores, cores e cores riscando o espaço, cores que eu desejaria fixar para sempre na retina assombrada. Foi a revelação: voltei decidida a me dedicar à pintura. E hoje, tantos anos passados, tenho a serena certeza de não me ter enganado. O meu caminho estava certo” (Luiz Martins, Em São Paulo, com Anita Malfatti. Vamos Ler!, RJ, 8/12/1939).

Não foi uma artista frágil como geralmente se divulga. Anita Malfatti tinha posições claras sobre suas pesquisas e caminhos que seguiu.”

Ver Anita Malfatti revela uma pintora convicta da arte que deveria trilhar. “Esta pesquisa evidencia que Anita Malfatti conduziu seu percurso de modos distintos, sempre procurando inovar, baseando-se em conhecimentos adquiridos em leituras, na observação de obras de artistas de diferentes épocas e na própria prática”, afirma Mayra.

“Não foi uma artista frágil, como geralmente se divulga. Ao contrário, observando a atuação da artista em São Paulo e mesmo em Paris, considerando sua correspondência com Mário de Andrade e suas anotações em diário e vendo sua produção, fica evidente que Anita Malfatti tinha posições claras relativamente às suas pesquisas e caminhos que seguiu.”

Quanto à famosa crítica de Monteiro Lobato à artista, a professora assinala: “É certo que ela não deve ter gostado, assim como não apreciou outras críticas negativas que outros teóricos fizeram a ela. Mas a de Lobato não a impediu de continuar expondo, como se pode constatar olhando o site. Na biografia, destaco algumas críticas que a defenderam, assim como algumas ideias artísticas de Monteiro Lobato, justamente para que se possa entender a crítica dele a Anita.”

O site aborda outras ideias artísticas da época, para que seja possível a compreensão do período e das várias posições dos intelectuais de então. “Procurei mostrar essa variedade para que não se continue a pensar que existia apenas uma posição naqueles anos de 1910 a 1920. Em geral, procurava-se uma arte nacional, mas a partir de pontos de vista diversos.”

O site Ver Anita é uma iniciativa do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. Contou com o apoio de Sylvia Malfatti Roberto de Sousa, diretora do Instituto Anita Malfatti.

Por Jornal da USP

Deixe o seu comentário